A AbriLivre informa que, em 20 de dezembro de 2023, o Departamento de Estudos Econômicos (“DEE”) do Conselho Administrativo de Defesa Econômico publicou no âmbito do Inquérito Administrativo nº 08700.001901/2017-90, a Nota Técnica nº 22/2023/DEE/CADE que concluiu:
“244. Ante o exposto, avalia-se que não é possível descartar que há indícios de que a Raízen fixava, e possivelmente, ainda fixa preço de revenda para alguns de seus revendedores.
- Na seção 4.1.1, analisaram-se relatos da Abrilivre, documentos constantes em processos judiciais e relatos de postos que responderam a ofício enviado pelo DEE. Alguns revendedores afirmaram que a Raízen determina o preço de compra de combustível de acordo com o preço de revenda que eles praticam. Ressalte-se que 144 postos afirmaram que a Raízen fixava ou sugeria preços ao responderem ao ofício enviado pelo DEE. Esses postos, ademais, relataram a mesma dinâmica: se o revendedor segue o preço de revenda preconizado pela empresa, ele compra combustível a um valor menor do que se não seguisse. Essa prática resulta no esmagamento da margem dos postos que não aderem ao preço preconizado.
- Na seção 4.1.2, utilizou-se dados públicos da ANP a fim de se verificar se haveria indícios de discriminação e esmagamento de margem praticado pela distribuidora. Verificou-se que diversos postos compraram combustível a preços superiores aos de revenda de seus concorrentes. Isso aconteceu com postos vinculados à Raízen, mas também com postos vinculados à Ipiranga e à Petrobras [Distribuidora (Vibra)]. Destaca-se que o esmagamento de margem e a discriminação podem, independentemente da fixação de preços, constituir-se como conduta anticompetitiva, como discutido na seção 4.1.3.
- Verificou-se, ademais, que a empresa tem um sistema de monitoramento conduzido por motoboys. Diversos postos que responderam ao ofício do DEE relataram esse procedimento, como debatido na seção 4.1.4. A Abrilivre também havia relatado a existência desse sistema. Mais ainda, considerando-se que os royalties pagos pelos postos à empresa baseiam-se na margem bruta do posto, é necessário ter algum monitoramento. O procedimento, no entanto, torna-se danoso à concorrência quando paralelo à conduta de fixação de preços.
- Embora, como afirmado, haja indícios da prática, ainda há dúvidas se o sistema CSOnline é utilizado para viabilizá-la ou torná-la mais eficiente. Conforme exposto na seção 4.1.5, em respostas ao questionário enviado pelo DEE, afirmou-se que as “sugestões” de preço eram feitas por meio do sistema. Houve, ademais, um revendedor que relatou ter conseguido ver os preços de seus concorrentes no sistema. A Raízen, contudo, negou-se a prestar informações sobre o seu funcionamento. Também informou que não guardava informações dos preços praticados pelos postos ou dos preços sugeridos pela empresa. Como o DEE entende que se pode estar diante de uma prática sistêmica de fixação de preços, entender o funcionamento com mais detalhes do CSOnline poderia ter papel crucial. Por essa razão, julga-se relevante buscar informações adicionais de como o sistema funciona.
- Não se constataram eficiências advindas da conduta, como consta da seção 4.1.6. Por fim, no que tange à análise da fixação de preços como conduta unilateral, verifica-se que a Raízen tem condições de empreendê-la e dela poderia resultar efeitos anticompetitivos. Na seção 4.1.7, esse tópico foi discutido. Argumenta-se que, mais importante que o poder de mercado da empresa em cada mercado isolado, é a característica dos contratos que firma com seus revendedores. Os contratos dão-lhe a possibilidade de determinar preços de revenda e são suficientemente longos para que sejam gerados efeitos. Há custo para os postos de rompê-los e há suspeitas, a serem melhor investigadas, de que um posto que rompe o contrato com uma distribuidora tem dificuldades em encontrar um novo fornecedor.
- Para verificar essa suspeita, analisaram-se dados cadastrais de postos de combustíveis no período entre 2008 e 2016. Verificou-se que houve poucas mudanças de bandeira. Essa análise, apresentada na seção 4.1.7.2, indica que, mesmo após o fim dos contratos, os postos mantêm-se na mesma bandeira. Tamanha estabilidade é improvável em um mercado competitivo, tanto mais porque, em face da exclusividade advinda do firmamento de um contrato, as distribuidoras deveriam disputar os acordos.
- Não se pode descartar a possibilidade de que a fixação de preços esteja sendo usada como meio de induzir conduta comercial uniforme. Em processo judicial, o posto Alcatraz afirmou que, ao tentar praticar preços menores que seus concorrentes, com o fim de aumentar suas vendas, foi questionado por representante da Raízen. Como se discute na seção 4.2, há também relato de posto respondente do questionário do DEE de que conseguia ver os preços praticados por concorrentes no sistema CSOnline. Esse fato, se comprovado, indicaria que a Raízen facilitaria a coordenação entre seus revendedores.
- Por fim, na seção 4.3, discute-se a rivalidade no setor de distribuição de combustíveis. Os diversos processos anteriores analisados pelo Cade indicam que esse setor não é muito competitivo. Na análise dos dados coletados no âmbito deste processo, verificou-se práticas muito semelhantes às da Raízen feita pela Ipiranga e pela Petrobras Distribuidora (Vibra). Assim, o DEE não descarta a possibilidade de seja necessário investigar essas duas empresas a fim de verificar se fixam preços a seus revendedores e se agem conjuntamente nesse sentido.
- Por essas razões, a análise econômica dispendida pelo DEE no presente inquérito não descarta a possibilidade de as práticas gerarem efeitos negativos à concorrência, caracterizando-se como uma conduta anticoncorrencial nos termos da Lei n.º 12.529/2011”.
Esta Nota Técnica será agora remetida a Superintendência-Geral do CADE, para que possa avaliar e decidir sobre a necessidade de dar prosseguimento na investigação, instaurar processo administrativo contra a Raízen e, conforme o caso, contra a Ipiranga e Vibra por práticas anticompetitivas, ou arquivar este inquérito.
Embora as conclusões apresentadas na Nota Técnica não sejam definitivas, demonstram, no mínimo, a existência de fortes indícios econômicos e factuais de que os contratos de exclusividade e as práticas comuns de precificação (“discriminação de preços” e “esmagamento de margem de revendedores”), adotadas por Raízen, Ipiranga e Vibra, não trazem, por um lado, eficiências econômicas; e, por outro, seriam a priori deletérias à livre iniciativa e à livre concorrência trazendo prejuízos ao ambiente concorrencial, como tem sido preconizado pela AbriLivre desde a sua constituição.
A AbriLivre continuará acompanhando de perto este procedimento e auxiliando as autoridades governamentais, revendedores e consumidores a garantir um ambiente livre e competitivo na cadeia brasileira de combustíveis automotivos.
Acesse a íntegra da Nota Técnica DEE pelo SEI_CADE – 1324569 – Nota Técnica